O grupo de estudo Narrativas e Memórias, coordenado, desde 2015, pela Profa. Dra. Cilene Pereira, discute, este semestre, o tema da violência, considerando várias perspectivas teóricas e áreas de conhecimento.
No encontro do dia 16 de março, foram discutidos três capítulos do livro "Brasil: mito fundador e sociedade autoritária" e o texto "A não violência do brasileiro, um mito interessantíssimo", da filósofa Marilena Chaui. Os textos ajudam entender a formação histórica do país e como funcionam os privilégios da elite e sua forma de bloqueio “de ações sociais e da opinião como expressão dos interesses e dos direitos de grupos e classes sociais diferenciados e/ou antagônicos”, conforme trecho de um dos textos: “Conservando as marcas da sociedade colonial escravista, ou aquilo que alguns estudiosos designam como ‘cultura senhorial’, a sociedade brasileira é marcada pela estrutura hierárquica do espaço social que determina a forma de uma sociedade fortemente verticalizada em todos os seus aspectos: nela, as relações sociais e intersubjetivas são sempre realizadas como relação entre um superior, que manda, e um inferior, que obedece. As diferenças e as simetrias são sempre transformadas em desigualdades que reforçam a relação mando-obediência. O outro jamais é reconhecido como sujeito nem como sujeito de direitos, jamais é reconhecido como subjetividade nem como alteridade. As relações entre os que se julgam iguais são de ‘parentesco’, isto é, de cumplicidade ou de compadrio; e entre os que são vistos como desiguais o relacionamento assume a forma do favor, da clientela, da tutela ou da cooptação”.
No dia 13 de abril, a violência foi discutida a partir dos pontos de vista da Psicanálise e da Antropologia, por meio de textos das autoras Maria Rita Kehl e Alba Zaluar, respectivamente, “Imagens da violência e violência das imagens" e "Democratização inacabada: fracasso da segurança pública". Em ambos os textos, foi destacado o papel da elite no processo histórico de violência em nosso país e a segregação social como elemento de violência social. Preocupada com a banalização da imagem da violência na indústria cultural, Kehl aponta que “o problema da espetacularização da violência, acrescida do tratamento realista da imagem, é que ela desfaz grande parte do efeito ético desses filmes, produzindo, alguns ‘efeitos colaterais’ importantes O mais óbvio é a elevação de nosso patamar de tolerância emocional para com a violência. A exposição exaustiva de nossa sensibilidade a cenas de horror, à visão do sofrimento de nossos semelhantes, à contemplação de corpos maltratados, feridos, destroçados, termina por nos tornar relativamente indiferentes. Cria-se um círculo vicioso: na medida em que nos acostumamos com a exposição às cenas mais tenebrosas, a indústria cinematográfica apela para efeitos espetaculares mais violentos, mais assustadores.” (KEHL, s/d, p. 91).
Para Zaluar, o crescimento dos índices de criminalidade em nosso país, após a democratização, além de consequência de nosso processo histórico de aprofundamento das desigualdades sociais, resulta também do tráfico de drogas internacional, que se alimenta dos esquemas de lavagem de dinheiro e da corrupção, e de práticas derivadas do aparelhamento militar do Estado na época da ditadura, com a formação de “grupos de extermínio ou de extorsão” (ZALUAR, s/d, p. 10).